sexta-feira, 27 de agosto de 2021

DAR A BUNDA É UMA SOLUÇÃO ESPIRITUAL




Muitas mulheres gostam de dar o cu, poucas o confessam, e menos ainda teriam coragem de transformar esse gosto e prazer num relato sem nenhum freio moral. TONI BENTLEY teve a coragem de escrever todo um livro que é uma ode ao sexo anal. Leiam um trecho de seu livro e gozem também com os ilustradores que escolhemos para este texto:


A SANTA FODA

Toni Bentley


Este prazer é tamanho que nada pode interferir nele, e o objeto que lhe

serve não pode, ao saboreá‐lo, deixar de ser transportado ao terceiro

céu. Nenhum outro é tão bom, nenhum outro pode satisfazer tão

completamente os dois indivíduos que cedem a ele, e aqueles que o

experimentaram sé conseguem voltar a outras coisas com dificuldade.

DONATIEN DE SADE


O dele foi o primeiro. No meu cu.

Não sei o tamanho exato, mas é definitivamente muito grande — do tamanho apropriado. De largura mediana, nem muito fino, nem muito grosso. Lindo. Minha bunda, minúscula como a de um rapazinho, rija e envolta por tecidos rígidos. Vinte e cinco anos de piruetas como bailarina.



Desde os 4 anos, quando declarei guerra a meu pai pela primeira vez. Girar as pernas para fora dos quadris fortalece o assoalho pélvico como um saca‐rolhas. Trabalhei minhas entranhas a vida inteira, de pé naquela barra de balé. Agora está tudo sendo destrabalhado.



O pau dele, minha bunda, libertando‐se. Divino.

Quando ele me penetra eu deixo sair a tensão, milímetro por milímetro, puxando, apertando, segurando. Sou viciada em resistência física extrema, uma maratona de intensidade libertadora. Solto meus músculos, meus tendões, minha carne, minha raiva, meu ego, minhas regras, meus censores, meus pais, minhas células, minha vida. Ao mesmo tempo puxo, sugo e o trago para dentro. Abrindo e sugando, uma coisa só.



Bem‐aventurada, aprendi, ao ser sodomizada, que esta é uma experiência de eternidade num instante de tempo real. A sodomia é o ato sexual de confiança final. Quero dizer, você realmente pode se machucar — se resistir.


Mas se deixar o medo para trás, literalmente ultrapassando‐o, ah, que felicidade e encontra do outro lado das convenções. A paz que se encontra além da dor. Ir além da dor é a chave. Uma vez absorvida, ela é neutralizada e permite a transformação. O prazer em si é uma mera absolvição temporária, uma distração sutil, uma anestesia enquanto se está a caminho de algo maior, mais profundo, mais embaixo. A eternidade fica muito, muito além do prazer. E além da dor. A borda do meu cu é o horizonte da sexualidade, a fronteira além da qual não há escapatória. Não para mim, pelo menos.


Sou ateísta por herança. Conheci a experiência divina dando o cu — muitas e muitas e muitas vezes. Sou uma aprendiz lenta — e hedonista gulosa. Estou falando sério. Muito sério. E fiquei ainda mais surpresa do que você está agora com esse despertar tão curiosamente grosseiro para um estado místico. Ali estava: a grande surpresa de Deus, Seu humor sutil e Sua presença potente manifestados no meu cu — bem, este certamente é um caminho para conseguir a atenção de uma cética.


Sexo anal tem a ver com cooperação. Cooperação num esforço de política aristocrática, envolvendo hierarquia rígida, posições feudais e atitudes monarquistas. Um está no controle, o outro é obediente. Inteiramente no controle, inteiramente obediente. Não há segurança democrática nem ação afirmativa para quem come um cu. Mas é melhor que eles tenham a ação firme, muito firme. Não se pode comer um cu pela metade, só o comecinho.



Seria um fingimento. Não há substitutos, nem reforços, para o Cirque du Soleil anal. É um ato na corda bamba — e vai até lá em cima.

A verdade sempre se mostra com o cu. Um pau no cu opera como a seta no detector de mentiras. O cu não sabe mentir, não pode mentir: você se machuca, fisicamente, se mentir. A boceta, por outro lado, pode mentir com a simples entrada de um pau no aposento — ela faz isso o tempo todo.


Bocetas são feitas para enganar os homens com seus jatos de sumo, sua prontidão para se abrir e suas donas irritadas.

Aprendi tanto, talvez a coisa mais importante, ao dar o cu — aprendi a me render. Tudo o que aprendi com o outro buraco foi a me sentir usada e abandonada.

Minha boceta propõe a pergunta; meu cu responde. Dar o cu é o acontecimento no qual a máxima consagrada de Rainer Maria Rilke, de "viver a pergunta", é de fato finalmente incorporada. Penetração anal resolve o dilema de dualidade que é introduzido e exagerado pela penetração vaginal.


Dar o cu transcende todos os opostos, todos os conflitos — positivo e negativo, bom e ruim, alto e baixo, raso e profundo, prazer e dor, amor e morte — e os unifica, torna‐os todos um só. Então isso, para mim, é O Ato.



Dar a bunda é uma solução espiritual. Quem poderia ter adivinhado?

Se me pedissem para escolher pelo resto da minha vida um local para ser penetrada, escolheria o cu. Minha boceta foi muito machucada por falsas expectativas e entradas sem convite, por movimentos muito egoístas, muito superficiais, muito rápidos ou muito inconscientes. Meu cu, conhecendo apenas ele, conhece apenas a bênção. A penetração é funda, muito funda; ela percorre a fronteira da sanidade. O caminho direto para Deus através de minhas entranhas tornou‐se claro, foi limpo.


Norman Mailer vê os caminhos sexuais ao contrário: "Então foi assim que eu finalmente fiz amor com ela, um minuto para um, um minuto para o outro, uma incursão ao Diabo e uma viagem de volta ao Senhor." Mas Mailer é um homem, um violador, um penetrador, não um recipiente, não um submisso.





Ele não esteve, presumo, em minha posição de cedente.

Minha sensação de falta é tão enorme, tão escancarada, tão cavernosa, tão funda, tão grande, tão larga, tão velha e tão jovem, muito jovem, que apenas um grande pau queimando fundo no meu cu a preencheu. Ele é esse pau. O pau que me salvou. Ele é a minha resposta para todos os homens que vieram antes dele. Minha vingança.



Vejo o pau dele como um instrumento terapêutico. Certamente apenas Deus poderia ter pensado em tal cura para minha ferida sem fundo — a ferida damulher cujo pai não a amava o suficiente. Talvez a ferida não seja realmente psicológica na origem, mas certamente o espaço lá dentro que sente falta de Deus o é. Talvez seja meramente a sensação de falta de uma mulher que acha que não pode tê‐Lo. Uma mulher cujo pai lhe disse muito tempo atrás que Deus não existe.

Mas eu quero Deus.


Dar o cu me enche de esperança. O desespero não tem nenhuma chance quando o pau dele está no meu cu, abrindo espaço para Deus. Ele abriu minha bunda e com aquela primeira estocada partiu minha negação a Deus, partiu minha vergonha e a expôs à luz. A sensação de falta não está mais escondida; agora ela tem nome. Esta é a história por trás de uma história de amor. Uma história por trás que é a história inteira. Uma história inteira por trás, para ser bastante precisa. Amor por dentro da minha bunda. Colette declarou que você não pode escrever sobre amor enquanto está sob sua emocionante influência, como se apenas a perda do amor ecoasse. Não há retrospecto para mim nesse grande amor, mas sim a vista dos fundos —glorificada por meu olho de trás.




(A entrega : Memórias eróticas / Toni Bentley, tradução de Maria Cláudia

Oliveira. — Rio de Janeiro : Objetiva, 2005)




ILUSTRADORES: GEORGES PICHARD (Paris, 17 de janeiro de 1920 — 9 de junho de 2003)

  Aprecio muito o trabalho dos ilustradores, geralmente desenhistas exímios, que se dedicam, muitas vezes, a ilustrar a publicação de obras ...