domingo, 4 de dezembro de 2022

BOCETAS

   

Um pouco de literatura – erótica, claro – para animar este blog. E não só literatura, mas também muita ilustração para encher os olhos depois de degustar o texto de Henry Miller. Leia, contemple, divirta-se quem gosta da fruta ou apenas gosta de olhar para a fruta:


"Há bocetas que riem e bocetas que falam; há bocetas malucas e histéricas com o formato de ocarinas e há bocetas abundantes e sismográficas que registram o subir e baixar da seiva; há bocetas canibalistas que se abrem como as fauces da baleia e o engolem vivo; há também bocetas masoquistas que se fecham como a ostra, têm conchas duras e talvez uma ou duas pérolas dentro; há bocetas ditirâmbicas que dançam à mera aproximação do pênis e ficam inteiramente úmidas com o êxtase; há as bocetas porco-espinho que abrem seus espinhos e sacodem bandeirinhas na época do Natal; há bocetas telegráficas que praticam o código Morse e deixam a mente cheia de pontos e traços; há as bocetas políticas que estão saturadas de ideologia e que negam até mesmo a menopausa; há bocetas vegetativas que não apresentam reação a menos que você as puxe pelas raízes; há as bocetas religiosas que cheiram como Adventistas do Sétimo Dia e estão cheias de contas, minhocas, conchas, excrementos de carneiro e de vez em quando migalhas de pão seco; há as bocetas mamíferas que são forradas com pele de lontra e hibernam durante o longo inverno; há bocetas navegantes equipadas como iates, que são boas para solitários e epilépticos; há bocetas glaciais nas quais você pode deixar cair estrelas cadentes sem provocar uma faísca; há bocetas mistas que não se enquadram em categorias ou descrições, com as quais você se encontra uma só vez na vida e que o deixam queimado e marcado; há bocetas feitas de pura alegria que não têm nome nem antecedentes e estas são as melhores de todas, mas para onde voaram elas?



E depois há a boceta das bocetas, que é tudo e que chamaremos de superboceta, porque não é desta terra, mas daquele brilhante país para onde fomos há muito tempo convidados a voar. Lá o orvalho está sempre brilhando e os altos caniços curvam-se com o vento."


























(Texto de Henry Miller, em TRÓPICO DE CAPRICÓRNIO; tradução de Aydan Arruda)

6 comentários:

ILUSTRADORES: GEORGES PICHARD (Paris, 17 de janeiro de 1920 — 9 de junho de 2003)

  Aprecio muito o trabalho dos ilustradores, geralmente desenhistas exímios, que se dedicam, muitas vezes, a ilustrar a publicação de obras ...